Friday, July 28, 2006

até logo


Iço velas na minha mente, apesar de a viagem ser feita com asas rasgando céus. Isto se a greve no aeroporto não continuar.
Espero voltar (talvez cá passe às golfadas durante as duas próximas semanas) com outras palavras que não (pelo menos não só) as do meu dia-a-dia. A voz (ainda que seja a voz escrita) dá vida, a palavra sabe parir o pensar, e espero transcrever pedaços das vozes que me povoam, para que também esses seres possam contar a sua história e assim viver. Não temam, as vozes não se devem a esquizofrenia, apesar da minha pouca capacidade de escrever o que quer que seja nesta hora.
Vou ver o meu oceano. Muitas vezes, quando o vejo, lembro que é o mesmo, apesar da latitude mais altaneira, que me viu nascer. Não o encontrarei revoltoso de amuo invernal, mas é meu na mesma.

Thursday, July 27, 2006

da arte da encadernação


Quem teve a ideia de encadernar livro colando as folhas não lê, certamente. Se o faz, lê palavras soltas no centro da página, só para disfarçar, eventualmente enquanto passa a tipa de ar intelectual que ele tenta impressionar, passeando-se de livro na mão ou sob o sovaco. Talvez resulte, pelo menos durante algum tempo, até a tipa perceber que deseja ser verdadeiramente conquistada por um ladrilhador ou limpa-chaminés pertencente a uma organização a favor dos livros cosidos à moda antiga, que se possam folhear vezes sem conta, sem medo, e sem ficar com páginas soltas na mão.

Tuesday, July 25, 2006

E Deus criou os vizinhos


Adão e Eva pensaram que não lhes podia suceder nada pior, caídos em desgraça que estavam. Afinal não era tão mau assim, continuavam a dispor da verdejante natureza que lhes fornecia alimento, escutavam aves irrequietas rasgando céus, deliciavam-se com aromas de flores. A vida era bela, de facto. Aí, Deus inventou os vizinhos.
Nunca está nada bem.
Se você faz barulho desnecessário (quando os raios de sol ainda espreitam) em tarefas absolutamente dispensáveis como a montagem de uma estante, pregar um - sim, um - quadro na parede ou aspirar a casa, é um desordeiro desrespeitador;
se está interessado em ter a sua própria parabólica e decidir acerca do tipo de lixo audiovisual que escolhe consumir, então está a transformar os alinhados telhados em plantações de cogumelos, mesmo que a sua antena não seja visível por nenhum olho vesgo;
se separa o lixo é um chato de primeira, um picuinhas tree-hugger e fanático:
se não separa é um atentado à politicamente-correcta-que ninguém-de-facto-cumpre-moderníssima ecologia;
se faz barulho durante o amor é um desavergonhado;
se não faz, é um chato sensaborão sem vida sexual.
E se você não é nada disto, se é um tipo discreto que não aparece muito, não passa três horas diárias falando com os vizinhos reformados, bem, então certamente você é um psicopata que enterra vítimas no jardim das traseiras (sim, sim, sempre suspeitámos de algo, era um sujeitinho estranho).

O respeito é fundamental. Concordo. Assino por baixo. Mas vizinhos assim não passam de amadores junto da Dona M., que pelos vistos também tinha muito respeito por mim. Ela tinha tanto respeito por mim que se dedicou a preencher com cores garridas as páginas da minha vida que lhe pareciam deamasiado em branco. Afinal de contas, eu não era uma personagem qualquer, e como tal merecia um enredo à altura, enredo este que a Dona M. generosamente partilhava, no seu afã de criadora, com pessoa que não suspeitava ser minha amiga. Um namorado longínquo era, segundo Dona M., um tipo lingrinhas. Eu ficaria bem servida, isso sim, com o seu filho mais velho, que ela fornecia num pacote que incluia curso de engenharia e jipe. O ponto alto da sua criação virava a minha vida do avesso. Descobri petrificada ter sido adoptada por aquela a quem chamava mãe (as evidências estão lá, veja a senhora bem, as duas não se parecem nadinha). Fui informada ( e ele também) de que meu pai enviuvara (antes dos vinte e três anos, que há quem enviuve sem casar) e a actual esposa me tinha criado como própria filha. Tendo em conta que uma pessoa que conheço convenceu, com sucesso e durante bom tempo, o irmão de que este tinha sido recolhido de uma caravana de ciganos que por ali passara, sendo então adoptado por aqueles a quem chamava pais, congratulo-me por ter álbuns de fotografias minhas acabada de nascer. Quer dizer...algo aproximado disso...

Friday, July 21, 2006

segunda viagem

Actualização tardia

O medo maior é o de sentir medo.
Porque não há medo então de me lançar e relançar neste livro, já saboreado, devorado, entranhado há tanto tempo? É que eu...bem, eu sinto medo de livros, assim como amo e abomino outros. Porque não os vejo como entidades diferentes de seres, com suas manias e qualidades. Não sinto medo deste. E acima de tudo, não sinto medo de vir a sentir medo.
Desta vez aventurei-me numa tradução portuguesa. Esta tem coisas boas. Mas fazem falta as palavras originais deste anglófono tardio, nascido na Ucrânia, de origem e base cultural polaca, que só aprendeu a língua inglesa após os vinte anos. É obra. É maravilhoso. Não me canso dele. Fez-me falta sobretudo encontrar uma das frases que comigo ficou sem esforço, gravada. A força é apenas um acidente que emerge da fraqueza de outros. Isto recorda-me também que é mais..."fácil" ser profundo em inglês do que em português. Não há qualquer afirmação de superioridade aqui. Apenas sensação e opinião. Palavras que ilustram canções soam bem a ouvidos anglófonos. A ouvidos hispânicos ou lusos fariam rir.
Este livro inspirou também um dos meus filmes preferidos, em absoluto, Apocalypse Now. Para amantes das obras em questão, vale a pena ver o documentário registado pela mulher de Coppola aquando da interminável e quase assassina realização do filme acima citado. Chama-se Hearts of Darkness. Também ele uma viagem ao nosso lado mais escuro.

Tuesday, July 18, 2006


Voltava conduzindo, em zona de lombas que forçam a lentidão. Um bom pedaço longe de mim vi um cachorro na estrada, junto de um autocarro que aguardava que os passageiros tivessem os pés bem assentes no seu destino. Tive uns instantes de preocupação, até verificar que o cachorro havia desaparecido da zona de perigo. Um pouco mais adiante, cheguei à pequena rotunda perto de casa, o cachorro estava distante, correndo para atravessar a estrada na passadeira. Ri e achei piada, seguindo para o portão, de comando em riste. Quando estaciono, o mesmo cachorro está ao lado do carro, aguardando que eu saia. Muito deve ter corrido para chegar ali, ele que estava ainda a distância considerável do carro...Terá corrido ainda mais para ainda chegar a tempo de apanhar o portão aberto.
Pronto, cá vamos nós de novo... Estou proibida pelos que me são próximos de falar com cachorros e gatos que passem por mim na rua, sobretudo os primeiros, pois a hipótese de me seguirem é considerável, e as minhas companhias estão sempre a puxar-me para o lado praticozinho da vida, que sempre me escapa.
Ainda dentro do carro, verifico que o cachorro, apesar de não ter coleira, terá certamente dono. Sinto-me incrivelmente triste pensando que em Portugal essa não seria a minha conclusão, de todo.Tem um peso normal e bom aspecto. Pronto, assim já o poderei mandar embora de consciência mais tranquila (yeah, right...). Está naturalmente ofegante, faz um calor terrível, e pelo menos água gostaria de dar-lhe, mas já imagino o que depois se pode seguir, que inclui a minha expulsão do condomínio por estimular a presença de um animal na oh so lovely residência... Fui mandando o cachorro seguir seu caminho carinhosamente, o que como calculam não é a forma mais eficaz de o fazer. Eu primo pela ineficácia. O cachorro não só me seguiu com olhar lânguido até casa, como enfiou o focinho entre a porta e a arranhou para entrar comigo. Nos sacos de compras eu não trazia nada que o pudesse cativar, e fui eu quem o viu, não o contrário, na estrada. Ele só pode ter escutado os meus pensamentos. E tinha algo para me dizer, estou certa. Badamerda a praticidade...


Pena o cheiro não viajar através de cabos e modems. Admiro a tenacidade desta plantinha, a força com que uma pernada solitária se agarra à vida, o caule que busca na terra seus nutrientes. É uma boa parideira, mesmo tendo anca estreita. Pouco tempo depois, o vaso está repleto de rebentos. Em qualquer altura do ano. Não deixa de ter o seu capricho, porém. Vive de água, muita, muita água, exige-a, faz demandas, bate o pé e amua, murchando copiosamente se o líquido lhe falta. Por isso a compreendo tão bem.

Monday, July 17, 2006

Falta aqui algo. As pilhas acabaram pouco depois da chegada a St. Gilles, e assim a máquina já não registou mais das casas mal cuidadas, nem do calor sufocante de Arles, onde entrei num suposto espaço Van Gogh repleto de lojecas turísticas que vendem panos da Provença, saquinhos de alfazema e postais, milhares de postais. O corpo recusa-se tenazmente a colaborar em certos passeios, ameaça parar a qualquer instante. Nasci nos trópicos,amo sol e calor, mas tenho dificuldade em viver neste clima, para mim impiedosamente frio no Inverno e ignobilmente quente no Verão. Não de um calor que conforta, embala, que acorda enzimas e faz correr nas nossas veias felicidade, mas que sufoca.
Ocorre-me facilmente que o que falta são fotos de cães. Faço-as sempre que cometem o erro de me colocar uma máquina nas mãos. Dou-me conta que estou prestes a fazer um elogio a terras gaulesas. Verifico, a pedido de terceiros, que a minha fronte está quente, mas não é febre, garanto. Agora sorrio por ser difícil fazer fotos de cães nesta terra. Porque é muito raro encontrar um cão só deambulando pelas ruas. Eles tratam bem os cães. Pontos positivos no karma.Pronto, já chega de elogios.

O tempo serrou as pedras que foram carregadas e montadas no século XII, mas o muro continua a providenciar protecção ao lençol estendido. Ah, o tempo não... foram as Guerras da Religião que ironicamente a foram devastando, de 1562 a 1622.

Do lado de lá, descubro que ficam sempre anjos a velar, por mais sós que nos creiamos.

Alguém pensou bem que a pedra envelhecida não valia menos, merecia ela também uma senhora alva velando. Aprecio, pois a minha cultura de origem valoriza os mais velhos, apesar de a guerra subverter tudo aquilo em que cremos, sobretudo nós mesmos.

A senhora de alva pedra espreita o busto de Clemente IV, filho desta terra, papa no século XIII. Curiosamente, chamava-se Guy Foulques, e avisam que não deve ser confundido com Guy Fawkes. Não ganhem juízo, não, que não é preciso...


A igreja com portas de uma cor tão minha prometia, mas lá dentro estavam noivos e convidados. A noiva, que encontrámos por uma viela vizinha, ia vestida de vermelho, como a porta. O meu amor achou estranho, no seu jeito de achar algo estranho, que dura um minuto e trinta segundos e depois some-se no ar. Eu achei naturalíssimo. Já vos disse que sou escorpião?



estender o braço e alcançar o Atlântico



Uma espreitadela a Alfama, aqui





Friday, July 14, 2006

Pronto, é só mais este.
Prometo.

Tudo isto existe, nem tudo é triste, mas tudo, tudo isto é fado - IV



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Passeio Fadista - Argentina Santos

Quem acha que o fado é tristeza, melancolia, desgraças de faca e alguidar e marialvas não percebe nada. É que, sendo também tudo isso, é muito, muito mais. E não tem de ser triste.
Não ficou a casa entre Graça e Alfama, os parapeitos coloridos, os varais de roupa estendida. Aqui alguém entra e diz que ma roubariam toda, e as molas também que os tempos estão difíceis.

Se sonhar em português e houver uma luz única, um rio que já é mar num encontro de cacilheiros cruzado, espero poder entrever, passando nas vielas alguma Rosa dos limões ou Júlia florista. Se o sonho tardar, posso sempre escutar o que da Argentina ficar.

Thursday, July 13, 2006

Tudo isto existe, nem tudo é triste, mas tudo, tudo isto é fado - III

Alfama, 1940, João Martins



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Lágrima- Argentina Santos

Foi a Amália que escreveu a letra. O Camané, então ainda desconhecido (pelo menos do grande público) encontrou um dia a senhora dona Amália. Deslumbrado buscou palavras para adereçar à sua musa. Esvaiu-se a voz que hoje tantos apreciam no pobre coitado, só conseguiu balbuciar que gostava tanto dela. Ela respondeu-lhe: Pois, filho, mas isso todos gostam...
Nada de mal entendidos, que ela no palco era humilde, e pedia muitas palminhas. Até pessoas que detestam fado adoram a Amália. Mas a Lágrima, como a Argentina ninguém a canta.
E pensar que, ah ironia, foi num documentário francês que a vi pela primeira vez...

Wednesday, July 12, 2006

Tudo isto existe, nem tudo é triste, mas tudo, tudo isto é fado - II






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Argentina Santos - Vida Vivida


Os amores difíceis são muito melhores, e estive convenientemente zangada com Lisboa durante um tempo, para depois abrir renovadas portas, consuma-se a paixão à descarada. Devo a renovação a um outro amor. Sonhei com ele viver entre Graça e Alfama, encher os parapeitos de janelas de flores de cores bizarras, estender a roupa em frágeis varais de chinela no pé. Sonhei até ver passar um dia, distraída dos tempos modernos, uma varina a caminho da ribeira, uma Rosa que vendesse limões ou uma Júlia que carregasse flores murchas. Então eu entraria na cozinha e abriria o pote com moedas e dar-lhe ia todas, a qualquer uma delas.

Esta senhora nasceu em Alfama. E em Alfama seguiu vivendo e cantando. Foi de poucos discos, menos aparições, poucos instantes em película registados para posteridade. Era convidada de honra na Grande Noite do Fado, mas saía do palco apressada, tinha que voltar para o restaurante, fritar os pastéis de bacalhau e cantar. Consta que só canta na sua Parreirinha de Alfama quando quer, segredou-me um francês que diz ter tido a honra de escutar a caprichosa diva. Eu cá digo que é honesta e que para o fado não se marcam horas.

Aproximando-se a passagem por Lisboa (ou Lesboa, como diria ela), vai crescendo em mim uma certa frustração, por saber que o meu sonho de a ouvir cantar ao vivo muito dificilmente será concretizado. O tempo é pouco, ou se calhar como ela canta, o tempo fica e a gente é que vai passando.

Tudo isto existe, nem tudo é triste, mas tudo, tudo isto é fado - I


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Argentina Santos - Amar Não é Pecado


Para os que não amam fado, a solução é simples: basta não accionar o play. Mas devo dizer-vos que se é esse o vosso caso, estão em pecado mortal. Há sempre tempo para redenção.
Esta senhora é embaixatriz do início do meu amor pelo país em que nasceu, há mais de oitenta anos. Foi ouvi-la e a minha postura de nacionalidade única foi pelo ralo abaixo.
Meu pai já me sondava há tempos, com o Carlos do Carmo. Na verdade, há muitos poucos fadistas homens que eu ame ouvir. Pouquíssimos. Mulheres, são várias. Mas esta senhora é única.
Nos últimos tempos, o fado voltou à moda. Quem diria... E regressa sobretudo (no sentido comercial) em vozes de meninas que seguem uma tradição inspirada provavelmente na Maria Teresa de Noronha, de família bem posta na vida. Quando a Noronha o fez, foi novidade. Porque o fado, nas suas raízes, está sobretudo associado a mulheres de reputação duvidosa (não sei de que duvidavam eles, mas lá que apareciam muitos tentando descortinar mistérios, ai lá isso apareciam). A história da mítica Severa ficará para outro dia. As coisas mudaram e hoje as fadistas já não são mal vistas. Bem ouvidas foram-no sempre, mesmo nos primórdios. Hoje em dia cantam-no meninas-bem. E algumas até o cantam bem. Nada, absolutamente nada contra.

Há mistérios na vida, e o saber cantar o fado é um deles. A boa voz tem muito pouco a ver, em alguns casos esta premissa ausenta-se, some-se nas vielas onde ainda mora gente, por quanto tempo desconheço. Quanto tempo até que Lisboa esteja desumanizada por completo? Em que se resuma a tascas de frequência turística e escritórios de seguradoras e advogados? Mas, dizia eu, a voz é relativa. Alfredo Marceneiro prova-o com excelência.



Tuesday, July 11, 2006

calemas


Admiro as vagas calamitosas que não cedem ao preceito social de se fazerem anunciar previamente, somente chegam e levam, lavam, tudo arcam com elas. Trágicas, aparentam crueldade, mas recordam a nossa dimensão reduzida.
Com as calemas contamos, porém, contamos em ambos os sentidos. Contamos porque sabemos que são certas, que vêm, inexoravelmente. E contamos também seis ondas mais modestas que preparam caminho nas águas para a sétima, a calema convidada de honra, ocupa todo o espaço no areal.
Em português falamos sempre de mar, mesmo sendo esse mar oceano. O mar aqui é imóvel, apenas ondulado por brisas, não fala comigo, não ruge zangado,não dança em alegria desenfreada, as ondas vêm mansas sem salpicar os rostos dos transeuntes, oferecendo-lhes a mais bela água benta.


(foto de Gonçalo Pinheiro)


Ela tinha uma relação tão às avessas com o tempo que chegou atrasada ao próprio nascimento.

Monday, July 10, 2006

Mr Bones

Pronto, confesso. Que li o Catcher in the Rye num ápice porque tinha na cabeceira um livrinho de Paul Auster.
Todos os cães que passam pela minha vida deixam a sua marca indelével. Se me refiro a eles como meus é por mera prática de discurso.


Foi um autor namorado de longe durante um bom tempo, na antecipação. Concretizei o caso há uns dois anos; até agora houve poucos encontros, mas memoráveis. Prometo ser-lhe fiel para sempre. Porque é preciso acreditar que estas coisas são eternas, mesmo que o não sejam.

Saturday, July 08, 2006

Nuvenzinhas negras...

Hoje foi inferno astral.

Vi tudo

Eu que tento ver, como Escorpião em recuperação, o mais


possível.

Desde notícias de vizinho armado (em parvo e com revólver), maus tratos a animais, passando por cartão caducado, estando o substituto a mil e tal quilómetros, enfim... Enfim escrevo o tal querido diário de que sempre fugi. Um dos pontos altos do dia foi a conversa surreal mantida com funcionário da empresa que mais queixas reúne de clientes. É obra e deviam receber um prémio por tal feito. Eu sugiro um inspirado no How to Irritate People, dos meus Monty Phyton.

(Final no post abaixo...)

...adocicadas no final

Combati a nuvem de forma algo perigosa. A cozinha é arte a ser exercida somente com boas energias. Felizmente ainda não há notícias de efeitos nefastos, as digestões decorrem tranquilas e felizes.
As fotos não são obviamente minhas, não houve tempo para elas antes de se passar ao ataque.
Um toque picante de xô pra lá coisa ruim nuns




e nuvens doces

flutuando em algo parecido a isto

Thursday, July 06, 2006

Sem Senso (dada a natureza ambígua e confusa do post, aconselha-se um qualquer paliativo. Se gostar de coisas chatas, muna-se de café)



Há muito quem se irrite e insurja contra o uso da palavra estória. F.J.V. é um exemplo, mas há muitos mais defensores aguerridos da lusa língua.No exemplo citado há senso, do qual no entanto eu pareço estar desprovida.

Ora eu, que muito me irrito com várias coisas (pois que sou naturalmente dada à irritação própria das criaturas pouco evoluídas - provoca-me urticária ouvir uma mulher dizer "obrigado", quando a palavra me é dirigida costumo responder que não se sinta obrigado a nada; tomo kompensan quando ouço falar na perca, mormente nos telejornais, entretanto o meu namorado olha-me de lado desejando que eu não perca a paciência e ouve-me repetir pela décima terceira vez nesse mês que a perca é um peixe, porra!, e em seguida toma ele um kompensan, que com o estômago não se brinca)- dizia eu, adoro a palavra estória, usando-a porém só em certos contextos - básica e essencialmente escrevendo ficção.

Em dicionários antigos a palavra tinha direito a lugar. Alguém houve que sugeriu até a sua adopção para uma mais eficaz diferenciação do termo história,algum admirador do anglicismo, perturbado com a louca e abundante polissemia presente na língua portuguesa. No fundo o tipo queria seguir o exemplo do inglês, com a distinção entre history e story. Já eu adoro essa polissemia, é fascinante e enriquecedora (parece contradição, mas sigamos adiante), até porque o facto de em português (bem mais do que em diversas outras línguas) uma palavra poder significar uma série de coisas não impediu que complicássemos ainda mais a vida do pobre estrangeiro que pretende,com carinhosa obstinação, aprender a língua lusa, ai pois não. Damos-lhe com força nos sinónimos, imensos, intermináveis, usando uma carrada de termos diferentes para nos referirmos à mesma coisa. Voltando ao tal senhor que quis a distinção história/estória: sim, é óbvio, o gajo pretendia que se usasse história para a ciência, naturalmente, e estória no sentido narrativo, particularmente para designar a de cunho tradicional, popular. A certo ponto, já os dicionários, continuando a incluir o termo estória, comandavam que consultássemos a história, letra h, vá, vire as páginas do calhamaço. Certo, certíssimo, tudo bem por mim. Teria estado tudo bem para parte dos linguistas se o termo estória tivesse permanecido dentro de um domínio de código específico e restrito. Dos registadores da literatura de cunho oral, talvez... João Guimarães Rosa, porém, ajudou na fuga da prisioneira, publicando Primeiras Estórias (1962), Tutaméia, subtítulo Terceiras Estórias (1967) e Estas Estórias (1969, já a título póstumo), escrevendo, sobranceiro, "estória não quer se tornar história". Ah, gentinha desobediente...

Rosa é apenas um exemplo, entre muitos, muitos outros. Na verdade, essa contenda não se inicia no Brasil. Na época medieval, a palavra era grafada de muitas formas diferentes, como é normal que aconteça numa língua que ainda não sedimentou normas ortográficas - historia, hestoria, estoria, istoria, estorea (assim mesmo, sem acentos, deixem lá as almas dos copistas medievais em paz). Inadmissível toda esta confusão, clamam os linguistas. Bem, os meus alunos nunca se mostraram confusos em relação a tudo isto, e as estórias surgiram-lhes diantes dos olhos, nos manuais que politicamente correctos inserem autores lusófonos de outras paragens. Se explicarem, eles entendem. Garanto. Os que recordo em particular eram garotos de doze anos. E não passaram a escrever estória...

Um aluno que use em exame escrito a estrutura sintáctica de Saramago será muito provavelmente chumbado; se tiver o azar de tentar sua sorte escrevendo num estilo semelhante ao de Lobo Antunes verá a sua caligrafia sublinhada com irregulares linhas vermelhas de censura, a não ser que se limite ao lobo antonismo das crónicas. Misturo alhos e bugalhos, talvez.
O que sei é que coexistem em mim multiplicidades lusófonas, cada qual com lugar a registo próprio.Quando escrevo pouco controlo, são as personagens que me escolhem, não eu a elas, se me atrevo se quer a lhes querer mudar os nomes que me sugerem, insurgem-se, mostram-me as linhas das suas mãos e destinos, que tenho de ler e seguir. E se tiverem estórias, além de histórias, para me contar, não serei certamente eu a calá-las. Até porque eu gosto de estórias. E de estoriar. E gosto muito de história. E de histórias, também.


Actualização: escrevi tanto e ainda assim omiti coisas essenciais (para mim, claro). Continue-se nos comentários :)
Infâmia! com tanto paleio, como diria a Carolina, do Sardinheiras, não mencionei nomes com quem cresci, e que me fizeram crescer. Como me atrevi a deixar de fora o Luandino Vieira... e as Estórias Abensonhadas do Mia Couto?

mal perder vs mau perder

O Francisco lembra o conhecido estrabismo deste senhor.





'No imaginaba llegar hasta acá'

E que tal umas coisas destas?

Wednesday, July 05, 2006

Reflexão Inútil #321



E de repente, todos têm um blog, com especial destaque para aqueles que nunca gostaram de escrever. Nada de mal entendidos. Aqui não há recados para ninguém, muito menos para os que me costumam visitar. Tenho em mente outras pessoas. Têm, absolutamente, direito a ter um blog, um querido diário,um pasquim com secção de correio sentimental, e até, ui....uma secção de poesia. Enfim, aquilo que quiserem. Mas esta aqui, nas suas imensas limitações, tem algumas dúvidas. É que eu pensava que, certamente, naturalmente, há muito quem goste de ler sem gostar de escrever. Meus neurónios acompanham. O que eu não sabia é que afinal é possível gostar de escrever e detestar ler.

Tuesday, July 04, 2006

água


Para limpar, teria de ter sal. Directa do mar ou do saco lacrimal.

Monday, July 03, 2006

Como dizia a Quel, na hora de xingar os adversários toda a gente se entenderia

Bem lembrada pela Jo Ann (entre mes lignes, aí ao lado, nas linhas babilónicas) esta publicidade :)

Caramba


bandeiras lusofonia
Originally uploaded by Kanuthya.




A língua é minha pátria
E eu não tenho pátria,
Tenho mátria
E quero frátria.
Caetano Veloso



Já a 1 de Fevereiro de 2006 (raios partam o html)recordei como nasceu a paixão. Este fim-de-semana perseguiu-me a reflexão, insistente, impiedosa, das que não dão descanso. A amiga Ali questiona se outros povos colonizados apoiam os seus colonizadores da mesma forma que os moçambicanos o fazem. Ah, eu atrever-me-ia a dizer que noutros locais talvez o façam mais ainda. Moçambique sempre teve uma forte influência anglófona, mas isso é assunto para outros tempos. É complexa a questão, e não raramente encontramos uma relação de amor-ódio nestes meandros. Diziam-me ontem que também certamente os países de expressão francófona festejam em uníssono com terras gaulesas. Lamento, mas creio não existir comparação possível com o que se passa no mundo lusófono. E hoje, na ressaca da meditação eufórica de fim-de-semana, outro amigo reafirma amor, carinho e fascínio por esta língua, ele que fala a que chamamos la bella lingua.
Nunca esqueci uma crónica de Mia Couto, que lamento não poder recuperar para dar como referência aqui. Estava-se então no início da década de 90, falava-se crescentemente na lusofonia, nos PALOP, nos acordos ortográficos. Mia, na sua sabedoria, desejava um encontro, em vez de um encontrão. Já houve encontrão que chegasse. Prepotência de mãos dadas com a ousadia, vergonha, actos inomináveis, assassinato, escravatura, subjugação sexual. Houve também (talvez excepções felizes)humanismo, coração aberto, miscegenação que partiu do coração e não da força, mistura de corpos, odores, sabores e sons.
Quero minha mãe assim, com muitos, muitos filhos. Não há nada como ter irmãos.