Tuesday, January 16, 2007

Sophie's Choice


Raras vezes prolonguei tanto uma leitura amada. É certo que o livro é relativamente extenso, mas o stretching foi consciente, destinado a alongar o prazer da leitura. Um raro caso em que a adaptação cinematográfica é magnífica. No livro, porém, e como seria de esperar, fico a conhecer muito melhor Sophie, as suas outras escolhas em tempo de terror. Terror que não termina com desembarques heróicos, com libertações de campos. Terror gravado na pele, muito além de números no pulso.
Já no final, acrescenta-se um outro meu terror. O vocabulário de Styron é rico, pleno de lemas pouco comuns no inglês coloquial, assim como de termos em outras línguas, yiddish, alemão, francês. Surge-me então algo que me faz piscar os olhos, já incerta do funcionamento de neurónios a hora tardia, preocupada com a escassa luz. Terei lido bem? "auto de fé", escreve Styron. Sou confrontada depois com o que me é dito ao lado, "deve ser espanhol, naturalmente". Não. Não é. Fé não tem acento em espanhol. É portuguesa, a expressão. Consequência de leituras impressionantes que terá feito sobre a Inquisição lusa. Porque muitas leituras fez sobre a perseguição já milenar a um povo. Como a muitos outros. Elie Wiesel recorda-nos o que foi dito aquando da revelação ao mundo dos horrores dos campos de concentração da Guerra II. Já não há numeração romana que valha à catalogação de horrores. Disse-se, na altura: Never again. Há que divulgar e conhecer, ousar tentar, apenas tentar, compreender. Um pouco que seja. Para não repetir. Para aprender.
Não adiantou de nada.
Continua. Não noticiado. Todos os dias. Aqui, por exemplo, www.darfurgenocide.org/.

3 comments:

Anonymous said...

auto da fé é uma das poucas palavras da nossa língua que entraram no vocabulário italiano. Tá lá no dicionário deles.
Mas no Garzanti dizem que veio do espanhol...
ps: eu nunca li o livro, só vi o filme, que aliás a Meryl já declarou que devia passar de novo no cinema, pois para ela é filme de cinema e não de caixinha. :-*

Carolina said...

Belo filme!
Bela actriz!
O livro não li, mas pelo que diz valerá a pena ler.

kanuthya said...

quel, o que me chamou a atenção foi o acento. Fui confirmar e em espanhol não tinha acento. Logo deduzi que tivesse vindo do português. Mas esta história de confusão entre as duas línguas já tem barbas, e por vezes aborrece-nos, verdad? :)

carolina O livro vale a pena, definitivamente, é maravilhoso. Não conheço é a tradução portuguesa, espero que faça justiça à riqueza vocabular e estilística do autor!