Tuesday, August 22, 2006

Galegos


Daqui vem parte do que sou. Para aqui parece que vou, por algum tempo, daqui a algum tempo.
Neste continente galegos são mesmo os naturais da Galiza, na Lisboa antiga era nome dado a moços de fretes, recados, e moços de esquina (o que quer que tal signifique...). Venho a descobrir, com esgar triste e repelente, que em sentido figurativo, o dicionário refere o uso de galegos para pessoas ordinárias, fracas, de pequeno valor. Creio estar perdido há muito este valor do termo. Em geral o som da palavra coloca um sorriso na face. Do outro lado do oceano, porém, a palavra adquiriu sentidos diversos. Não vou verificar, refiro só o que recordo. Recordo que é adjectivo aplicado a pessoas que trabalham muito (como aliás também sucedia em Portugal, como se compreenderá num próximo post, embora actualmente poucos jovens o saibam), e a pessoas de pele clara, cabelos loiros, como a Eduarda, personagem de Riacho Doce, de José Lins do Rego, que era sueca. É natural que assim seja, galegos, minhotos e transmontanos misturaram-se, e há predominância de peles, cabelos e olhos claros. São celtas, na sua origem. Festa de romaria que se preze tem de nesta zona ter gaita de foles.
Calo-me e dou palavra a outrém. Este texto foi-me oferecido num pedaço de papel arrancado de alguma parte, talvez de uma agenda original, que em vez de frases inspiradoras apresenta para cada dia um pedacinho de história.
Só alguém que me ama muito e me conhece bem me poderia dar tal prenda. Obrigada, S.

Os senhores da água, os galegos, merecem uma nota que os separe dos que aparecem sempre na sua companhia, como negros, mulatos, mouros, etc... Por duas razões: porque em finais do século XVIII já eram 60 000, número considerável em relação à população total de Lisboa, e porque a sua acção foi importante na história da alimentação da cidade, tão importante que essa acção chegou aos nossos dias transmitindo usos que se transformaram em emblema da cidade como, por exemplo, as populares "iscas com elas". Era gente forte, muito robusta, preparada para trabalhos pesados, que tinham como característica principal serem muito económicos. Não se metiam em brigas, e nunca eram tidos como culpados de qualquer roubo ou crime. eram orgulhosos e desembaraçados e raramente ofereciam os seus préstimos, aguardavam que alguém os pedisse. Os galegos em Lisboa eram vendedores de água, moços de frete de corda ao ombro, moços de lojas e armazéns, criados de hospedarias e casas particulares, cocheiros, trintanários, varredores de ruas e empregados das tabernas e casas de pasto. foi nesta actividade, e na de aguadeiro, que se tornaram conhecidos e que se enraizaram na cidade. Trabalhavam muito, viviam economicamente edepois de juntar algum dinbheiro, partiam para as suas terras e compravam um terreno. Em 1801 houve uma tentativa de os expulsar por causa da guerra mas o Intendente Geral da Polícia avisou que, expulsando-os deixava de haver quem servisse a cidade. Foram deixados em paz e continuaram. Em relação aos criados portugueses, mais subservientes, os galegos eram mais orgulhosos, mais limpos, mais fiéis e mais sóbrios. Quando chovia e a lama deixava as ruas da cidade em estado lastimável, eram eles que carregavam as pessoas. Os que vendiam água iam encher as suas barricas decoradas aos chafarizes e depois apregoavam a "áááágua freeesca, frisquinha, quem quer beber áugua freeesca?". vendiam cada copo de água a 5 réis. [...]

Alfredo Saramago, Para Uma História da Alimentação de Lisboa e Seu Termo

trintanário - lacaio que vai ao lado do cocheiro e que abre a portinhola da carruagem.

7 comments:

Carolina said...

Já o meu pai dizia referindo-se a alguém que trabalhava muito : Trabalha que nem um galego!
E eu sou do tempo em que os Galegos (os da nossa pastelaria em Sines) andavam com dois cestos de nos braços a vender bolos pelas ruas de Santiago e no liceu e depois na praia de Sines.
E eu ficava sempre com água na boca porque um pastel de nata custava um dinheirão: 10 tostões! (imaginem!)
Estes Galegos são um bom exemplo de gente trabalhadora e honesta!
Viva a Pastelaria Vela de Ouro, mais conhecida por: Os Galegos!!!

kanuthya said...
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Anonymous said...

É verdade. No nordeste do Brasil costuma-se chamar de galegos as pessoas de pele clara e cabelos loiros.
Na Argentina são os personagens recorrentes de piadas - as mesmas que contamos sobre os portugueses e os franceses sobre os belgas.
Uma vez estive em Galícia. Gostei muito. Eu entendia tudo e não conseguia dizer nada.

Anonymous said...

Cê já foi?

kanuthya said...

Fui não :)
Mas ando perdida no meio de papeladas, traduções chatas de ensaios técnicos de reciclagem mecânica de polímeros! buáaaaa

Anonymous said...

xi! chato mesmo :D
eu estou morrendo de sono1 quem me dera ser argentina e dormir a siesta!

kanuthya said...

quel Pois eu fujo da sesta, quando acordo estou transformada num monstro de má disposição :) Nem vivendo em Espanha a faria!