Tuesday, August 23, 2005

Do tal poeta dado a artes gastronómicas, com o perdão pela alteração do desenho estrófico


caldillo_congrio
Originally uploaded by Kanuthya.

No mar tormentoso do Chile vive o rosado congro, enguia gigante de nevada carne. E nas panelas chilenas, na costa, nasceu o caldillo grávido e suculento, proveitoso. Levam para a cozinha o congro esfolado, a sua manchada pele cede como uma luva e a descoberto fica então a uva do mar, o congro tenro reluz já nu, preparado para o nosso apetite. Agora pegas em alhos, acaricia primeiro esse marfim precioso, cheira a sua fragância iracunda, então deixa o alho picado cair com a cebola e o tomate, até que a cebola tenha cor de ouro. Entretanto cozem-se no vapor os reais camarões marinhos, e quando estiverem a chegar ao seu ponto, quando se consolidar o sabor num molho formado pelo suco do oceano e pela água clara que soltou a luz da cebola, então que entre o congro e mergulhe na glória, que na panela se aceite, se contraia e se impregne. Já só é necessário deixar no manjar cair o creme como uma rosa espessa e ao lume lentamente entregar o tesouro até que no caldillo se aqueçam as essências do Chile, e à mesa cheguem recém-casados os sabores do mar e da terra, para que nesse prato tu conheças o céu.

In Odes Elementares, de Pablo Neruda

2 comments:

Carolina said...

Cá está uma refinada receita para eu estrear o meu forn(inho)!!!

Anonymous said...

depois de um dia de trabalho, chego a casa e faço uma salada de corações de alcachofra com tomate, regado com azeite, uns oregãos e pimenta preta...penso eu estar satisfeita, até ao momento que venho ao teu blog e fico completamenta faminta!! não é justo:P
bjinho gordo*
soraia