Thursday, September 07, 2006

Meio regresso com palavras roubadas - Carta de Neruda a Albertina

"A primeira coisa que tenho de fazer, para escrever-te, é ver se a tinta corre neste mau papel. Agora, já sei que corre, e sempre te escrevo. Porquê tão pequena a tua carta? Bom. Esta noite vou enviar-te uma mensagem telepática. Vou dizer-te: "Amo-te, Arabela". Hás-de ouvi-la às três da manhã, quando estiveres a dormir.
Na outra noite, ontem, houve um incêndio aqui, defronte da minha casa. Quase que nos queimávamos. Chamas, altas e belas, água, lágrimas da minha mãe. Eu cá diverti-me imenso. Depois choveu.
Tu estás bem no retrato, mas és mais bonita. hei-de, um dia, fazer-te um; pintarei a tua boina da cor que tem, a tua boca da cor que tem; e os teus olhos que são da cor do chá. Hei-de pintar-te sentada à janela, e, quando virem o quadro, hão-de todos dizer: "Quem é esta menina tão triste?"
Não saio, sequer, de casa. Chove, quase sempre. Passo o tempo como que adormecido. Enterrado num velho cadeirão, como a minha avó, ao lado de um braseiro, pensando que no inferno deve chover como nesta terra bendita.
Surpreendo-me às vezes a pensar em ti - e noutras coisas inúteis - mas volto logo a mim e digo com os meus botões: Ela saiu-me uma boa rês.
Esta tinta encarnada faz-te doer os olhos, Pequena? Não é verdade?

Pablo

24 de Julho"

2 comments:

Anonymous said...

não é roubo.
:-*

_+*Ælitis*+_ said...

O laptop ainda esta na UTI ? :(